Autoras: Nicole Marina Almeida Maia; Vanessa Carolinede Oliveira; Maria José do Amaral e Paiva; Mirielle Teixeira Lourenço; Larissa Lorrane Rodrigues Borges – Universidade Federal de Viçosa
Mercado dos corantes naturais
Atualmente, os corantes naturais são uma alternativa de aditivo para o processamento de alimentos mais saudáveis e um grande desafio para a indústria de alimentos. Isso porque dentre as variadas fontes naturais para se obter cores, existem alguns obstáculos como a estabilidade colorimétrica de moléculas na presença de fatores ambientais que prejudica a conservação e funcionalidade dos corantes. No entanto, o desafio vale o empreendimento, pois o mercado global de corantes naturais apresenta crescimento acentuado, sendo que em 2019 foi estimado que o volume financeiro movimentado totalizaria US$ 2,9 bilhões (1). Neste breve informe técnico apresentaremos algumas fontes de corantes naturais provenientes de frutas e vegetais e os seus principais desafios tecnológicos. Por fim, a técnica de microencapsulação é proposta como alternativa para aumentar a estabilidade colorimétrica e a validade dos pigmentos naturais.
Principais Fontes de Corantes Naturais Hidrossolúveis: antocianinas e betalaínas
A classe de pigmentos do tipo clorofila, carotenoide e flavonoide são as classes que contém as maiores fontes de corantes naturais, no entanto, os pigmentos de betalaínas e melaninas embora em quantidades menores apresentam algumas fontes de cor de interesse industrial (2).
As antocianinas são o maior grupo de pigmentos solúveis em água e apresentam diferentes tonalidades (vermelho, azul, roxo, violeta). Suas cores são atrativas, apresentam baixa toxicidade e ainda têm elevado poder antioxidante sendo potencialmente benéficas para combater os radicais livres que são responsáveis por desencadear desordens metabólicas no organismo. As principais fontes de antocianinas são frutas como jabuticaba, mirtilo, jambo-vermelho, amora, uva e diversas flores comestíveis não convencionais como a cunhã, flores de ora-pro-nóbis e hibisco.
As betalaínas, por sua vez, são pigmentos hidrossolúveis nitrogenados que apresentam pigmentação alaranjada (betaxantinas) e vermelho/violeta (betacianinas) e estão entre os principais pigmentos utilizados pela indústria alimentícia (3). A beterraba é a principal fonte deste pigmento e quando esse vegetal é submetido ao mínimo processamento (descascamento) há redução entre 99,4% e 82,9%, respectivamente, do teor de betacianinas e betaxantinas. No processamento (trituração) a redução de pigmentos está entre 91,6% e 67,5% de betacianinas e betaxantinas, concomitantemente. E no armazenamento o conteúdo de pigmentos ocasiona perdas entre 53,1% de betacianinas e 63,6% de betaxantinas (3).
Tanto as betalaínas quanto as antocianinas são moléculas mais estáveis quando estão glicosiladas, em alta concentração e alto grau de acilação, pouca atividade de água, baixa temperatura e luminosidade. A diferença reside no fato que as betalaínas necessitam de uma atmosfera nitrogenada e pH em torno de 3 e 7 enquanto as antocianinas possuem melhor estabilidade em pH ácido. Ambas estão sujeitas a ações enzimáticas degradantes, presença de O2 e H2O2.
Principais Fontes de Corantes Naturais Lipossolúveis: carotenoides do urucum e da cúrcuma
Os carotenoides são pigmentos lipossolúveis que apresentam a coloração laranja, amarela e vermelha em muitos alimentos e dentre os carotenoides presentes estão a luteína, o licopeno, a curcumina e a bixina (4). As fontes são diversas frutas e vegetais como a batata baroa, tomate, pêssego, alface verde, pimenta vermelha, melão, damasco, urucum, cúrcuma, entre outros.
No urucum, os carotenoides responsáveis pela pigmentação vermelha são a bixina e a norbixina e os seus extratos podem ser hidrossolúveis, lipossolúveis e lipo-hidrossolúveis o que lhe permite uma variedade de aplicações em alimentos. Outra vantagem são os compostos bioativos que proporcionam ao extrato de urucum atividade antioxidante e antimicrobiana (4). No entanto deve-se atentar para os fatores de estabilidade e consequente descoloração que está relacionada a reações de oxidação nas duplas ligações das moléculas: luminosidade, oxigênio, faixas extremas de pH. Vale ressaltar que o Brasil é um dos principais exportadores de urucum sendo um dos corantes naturais mais consumidos no mundo (5). É em grande parte devido a curcumina, presente na cúrcuma e comumente utilizada em pó, a responsabilidade pela coloração amarela e o seu flavour picante é principalmente a pela presença de óleos essenciais. A curcumina apresenta baixa solubilidade em água e boa solubilidade em óleo e solventes orgânicos, sendo a sua aplicação em sistemas hidrossolúveis contraindicada sem antes haver um tratamento prévio.
Tecnologia de microencapsulação como alternativa rentável para estabilidade de corantes naturais
Dentre os obstáculos para a produção de corantes naturais, podemos citar a estabilidade colorimétrica, uma vez que as moléculas orgânicas são muitas vezes altamente reativas e as condições de processamento de alimentos que incluem altas temperaturas, mudanças de pH e interações com outros componentes dos alimentos podem alterar o padrão de cor desejado. Dessa forma, a conservação do alimento que é produzido a partir de corantes naturais está sujeita a uma vida de prateleira menor devido a alterações ambientais e sensoriais.
A tecnologia de microencapsulação consiste em um processo onde partículas sensíveis são envoltas em um material de revestimento compatível e capaz de formar uma barreira de proteção para o composto alto, neste caso os corantes naturais (6). As microcápsulas que são obtidas no processo variam entre microcápsulas, microesferas ou micropartículas, dependendo da técnica utilizada. Essa tecnologia é capaz de proporcionar estabilidade aos corantes naturais e adicionalmente proporcionar uma liberação controlada durante o armazenamento porque o aprisionamento dos pigmentos naturais em um núcleo protegido evita a degradação por fatores ambientais (7). Algumas vantagens que a microencapsulação de corantes naturais proporciona são: soluções com coloração mais intensa (estabilidade colorimétrica), aumento na solubilidade de compostos lipossolúveis, preservação de compostos antioxidantes e compostos bioativos, estabilidade térmica, melhor estabilidade durante o armazenamento exposto à luz em relação ao extrato bruto. Existem variados materiais de revestimento e diversos processos de microencapsulação e proteger corantes naturais. Os materiais de revestimento mais comuns para encapsulação são gomas, açúcares, proteínas, polissacarídeos, ceras, lipídeos, polímeros sintéticos (8) em que se espera a formação de um revestimento coesivo, estável, não reativo com o núcleo, inodoro e com mecanismos de entrega específico após tratamento especifico (9). Dentre os processos de microencapsulação estão a coacervarão complexa, spray dryer, coextrusão ou baseadas em emulsão (9). Em alguns métodos, como o spray dryer, a microencapsulação e a secagem são feitas em um mesmo equipamento, já em outros métodos é necessária uma etapa adicional de secagem. Os métodos mais comuns de secagem são a liofilização, em que o material encapsulado é submetido a sublimação para a remoção de água e a secagem à vácuo sob pressão reduzida (10).
Diante disso, é essencial conhecer o comportamento físico-químico do corante natural de interesse para escolher o material de revestimento adequado que não reaja com o pigmento e nem com o produto alimentício no qual ele será destinado. Além de reações indesejadas, ao conhecer as características do pigmento e do material de revestimento é possível que se faça previsões em relação a temperatura, pH, pressão e qual a melhor técnica e o melhor equipamento a ser utilizado no processo de microencapsulação. Finalmente, é imprescindível desenvolver analises de estabilidade de cor e compostos bioativos; rendimento, atividade de água, higroscopicidade; dispersibilidade entre outros ensaios que certifiquem a eficiência de microencapsulação.
A figura 2 exemplifica o processo de microencapsulação e alguns métodos de secagem utilizados em estudos:
Em conclusão, deve-se atentar aos custos relativos ao processo visto que muitos métodos, como a liofilização, são onerosos e outros processos podem degradar compostos de interesse. Sendo assim, são necessários estudos de viabilidade financeira de projeto e também estudos científicos que atestem a eficiência da microencapsulação dos corantes naturais levando em consideração diversas variáveis quantitativas e qualitativas.
1 Mendoza B, Victor E, Guamán L, Lizbeth J. Comparison of the Cochineal Carmine market between Ecuador and Peru and its marketing potential to the European Union. Universidad de Las Fuerzas Armadas; 2019.
2. Schiozer AL, Barata LES. Stability of Natural Pigments and Dyes. Rev Fitos. 2007;3:6–24. Available from: http://www.revistafitos.far.fiocruz.br/index.php/revista-fitos/article/view/71
3. Kluge RA, Preczenhak AP. Betalains in Beet Root Fresh-Cut: Losses and Preservation Methods. Rev Iberoam Tecnol Postcosecha. 2016;17:175–92. Available from: https://www.redalyc.org/journal/813/81349041005/html/#:~:text=A conservação das betalaínas na,et al.%2C 2007).
4. Stringheta PC, Freitas PAV de. Natural Dyes: from nature’s diversity to applications and benefits. 1st ed. UFV, editor. Viçosa; 2021. 472 p.
5. Stringheta PC, Silva PI, Costa AGV. Annatto/Urucum—Bixa orellana. Exot Fruits Ref Guid. 2018 Jan 1;23–30.
6. Verma ML, Dhanya BS, Sukriti, Rani V, Thakur M, Jeslin J, et al. Carbohydrate and protein based biopolymeric nanoparticles: Current status and biotechnological applications. Vol. 154, International Journal of Biological Macromolecules. Elsevier B.V.; 2020. p. 390–412.
7. Cai D, Li X, Chen J, Jiang X, Ma X, Sun J, et al. A comprehensive review on innovative and advanced stabilization approaches of anthocyanin by modifying structure and controlling environmental factors. Food Chem. 2022 Jan 1;366:130611.
8. Gaonkar AG, Vasisht N, Khare AR, Sobel R. Microencapsulation in the Food Industry: A Practical Implementation Guide. Microencapsulation in the Food Industry: A Practical Implementation Guide. Elsevier; 2014. 1–569 p.
9. Choudhury N, Meghwal M, Das K. Microencapsulation: An overview on concepts, methods, properties and applications in foods. Vol. 2, Food Frontiers. John Wiley and Sons Inc; 2021. p. 426–42.
10. Multisona RR, Shirodkar S, Arnold M, Gramza-Michalowska A. Clitoria ternatea Flower and Its Bioactive Compounds: Potential Use as Microencapsulated Ingredient for Functional Foods. Vol. 13, Applied Sciences (Switzerland). MDPI; 2023.